Estamos perdendo a chance de compreender a cultura animal

Animais também transmitem práticas e hábitos socialmente

Redação FamiliarIdades
Cultura animal só passou a ser documentada recentemente. Foto: Getty Images.
Cultura animal só passou a ser documentada recentemente. Foto: Getty Images.

A cultura não é exclusividade humana. Cada vez mais, estudos demonstram que diversos animais possuem comportamentos culturais. Ou seja: hábitos e práticas transmitidos socialmente. Contudo, a rápida perda da biodiversidade ameaça não apenas as espécies, mas também o conhecimento que poderíamos adquirir sobre isso.

À medida que ecossistemas são destruídos e populações animais diminuem, culturas inteiras podem desaparecer antes mesmo de serem compreendidas. O caso das orcas é um exemplo marcante: diferentes grupos possuem dialetos próprios e estratégias de caça específicas, transmitidas entre gerações. Quando essas populações declinam, esses saberes se perdem para sempre. 

Da mesma forma, primatas como chimpanzés e macacos-prego demonstram variações culturais na forma como utilizam ferramentas para obter alimento. Mas a destruição de seus habitats ameaça a continuidade dessas tradições.

Outro fator preocupante é que muitas dessas culturas animais só foram documentadas recentemente. Ainda há muito a ser descoberto. Entretanto, a extinção de espécies e o isolamento de grupos reduzidos dificultam a observação de práticas como técnicas de caça, uso de ferramentas, vocalizações específicas e até mesmo rituais sociais. 

Preservando a cultura animal

Um estudo da Universidade de Victoria e do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva, ambos na Alemanha, enfatiza a necessidade de esforços de conservação urgentes para preservar não apenas as espécies, mas a cultura animal.

Segundo a coautora do estudo Ammie Kalan, da Universidade de Victoria, “os comportamentos culturais variam desde o canto das baleias até o uso de ferramentas pelos primatas. As adaptações às mudanças ambientais não apenas beneficiam os animais, mas fornecem dados importantes sobre as origens do comportamento e do aprendizado entre espécies. Contudo, a redução das populações globais é um desafio para o que ainda podemos esperar aprender.” 

Além disso, tais comportamentos podem fornecer insights valiosos sobre a história e a cultura humana, especialmente ao interpretar registros arqueológicos. 

“Os primatas não humanos compartilham uma história evolutiva comum com os humanos, e estudo disso pode fornecer informações importantes sobre nossas origens”, diz outra coautora do estudo, Lydia Luncz, do Instituto Max Planck.

Ela vai além ao dizer que “essas criaturas excepcionalmente complexas estão ameaçadas de extinção, destacando a necessidade urgente de protegê-las, conservá-las e conservar também seu modo de vida”.

Os pesquisadores sugerem que tecnologias como a digitalização 3D podem ajudar a preservar registros desses comportamentos. Isso porque podem “replicar artefatos físicos associados ao comportamento animal ou gravar e analisar sons e canções feitas por diferentes espécies.”

A conclusão é clara: proteger a biodiversidade também significa proteger nossa herança cultural compartilhada com outras espécies. A pesquisa chama atenção para a interconexão entre todas as formas de vida e a necessidade de estratégias de conservação mais inclusivas e abrangentes. 

Portanto, a conservação não deve ser apenas uma questão de preservar números de indivíduos ou evitar extinções. É também uma luta para manter vivas as culturas não humanas. Assim, reconhecer que o aprendizado e a transmissão de conhecimento são fenômenos compartilhados por diversas formas de vida. 

Proteger a biodiversidade significa, em última instância, fortalecer um patrimônio cultural muito mais amplo do que costumamos imaginar.

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